Bem-vindos à nova dimensão... seqüenciador de sonhos online.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Jogos que jogamos…

Corria, como em muito tempo não pudera correr. E aquilo era bom. Sentia o vento à face e isso o ajudava a ignorar o quanto suava. Era novo, porque cada um daqueles momentos sempre o seria. O coração acelerado, pulsando pelas veias até o pulso, o punho… até a espada.

A terra sob seus pés, antes tapetes de grama imaculada, ia sendo marcada pelas pisadas firmes e pelos fluidos e entranhas que gotejavam de suas roupas e da arma. O quanto daquilo podia ser seu, sinceramente, não lhe importava ali. Enquanto não sentisse dor, não pretendia parar. Sorria, ao mesmo tempo que respirava fundo. Golpe a golpe. Ao longe, aguardavam-no no Palácio. E era tudo o que realmente valia a pena.

 
+Rodeur+, de *BoryChan no deviantART.

Ninguém podia dizer como aquele jovem guerreiro seguia, tão resoluto. Mas sabiam que não conseguiam atingi-lo, decerto. Sua espada parecia dançar à luz do sol enquanto aquelas gargalhadas traziam um tormento final às suas vítimas. Uma a uma abriam caminho, mas não por opção. Tombavam, como se formando-lhe uma trilha macabra sob os pés.

Cantarolava… o pequeno, quase insano, repetia todo tipo de frases tolas de canções, algumas horas até mesmo dançando ao seu ritmo, como em coreografias da tela da TV. As mesmas batalhas de sempre, mas os golpes leves. O Rei Troll dormia, ignorava o menino guerreiro enquanto esse limpava seu reino de mais aquelas bestas.

Era bufão, pq sempre fôra de sua natureza… mas jamais vira tudo tão claro quanto naquele momento. Um metamorfo, uma das crianças bestiais da natureza, espiando a investida daqueles seres com olhares argutos, felinos, antes de surpreendê-los com o próximo golpe. O sobretudo, tão antiquado e puído, lhe dava um ar de pícara soberba.

Divertia-se, talvez demais, com tudo… a respiração aos poucos retomando seu ritmo normal, mas o ar de empolgação incessante. Pisava cada degrau com ar de grandeza, mas deixava a ponta da espada desbastar-se, arrastando por sobre o granito, como se quisesse apenas fazer barulho.

Estava em casa e podia suspirar, bem fundo…

“Amor, a pia da cozinha quebrou de novo.”

… mas não poderia, ainda, descansar.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Travessuras, III de III

- Ler a Parte I
- Ler a Parte II
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well, de =bagnino no deviantART.

Ela era realmente a coisa mais bela que já vira à beira do poço. Seus olhos incansáveis, apesar do adormecer de eras, o haviam feito despertar, à visão da sorridente menina em seu ato de liberdade.

Do fundo daquelas águas, borbulhava em fascínio e fome, enquanto estendia-se pelas paredes escorregadias de pedra desbastada. Subia, sem um som sequer exceto o sibilar da própria respiração… a boca entreaberta, o olhar aguçado. A escuridão de seu lar ancestral não o incomodava. Do alto, escutaria-se apenas com atenção, o gotejar que aquele soturno alpinista deixava cair sobre o espelho de água escura, bem ao fundo.

***

O homem que a tudo admirava abriu-se o arregalar em espanto. Estendia a mão, como se quisesse gritar para avisá-la, mas o horror fôra maior e tomara-lhe a voz. Uma lágrima escorrendo pelo canto do rosto, a única coisa não paralisada pelo medo.

***

Sua avó lhe avisara muitas vezes que não se aproximasse dali. Cada história mais terrível do que a última. E ali, quis gritar por ela ou por qualquer um…

A primeira coisa que sentira parecera-lhe uma carícia aos cabelos. Demorou a perceber que não poderia haver mais alguém, ali. O que lhe envolvera a cintura, cinzento e frio, em nada parecia que já poderia algum dia ter sido um braço.

A dor vira rápido demais, insuportável, arrancando-lhe o fôlego e as forças. E foi quando seus olhos enfim notaram o humilde trabalhador. Estendia-lhe a mão, em desespero…

Sua avó lhe avisara muitas vezes que não se aproximasse dali… pedia perdão a ela, enquanto o céu estrelado distanciava-se, acima.