- ... inferno.
Cada novo corredor era exatamente igual ao último e ele já se cansava das mesmas paredes escuras e do mesmo horrível cheiro de mofo. A umidade do ar fazia do suor um incômodo grudento, as calças já com a barra tão suja e puída que jamais se diria que algum dia foram tão elegantes. O Andarilho Cinzento amaldiçoava-se por não ter imaginado que Naquela noite teria de percorrer o Véu, uma vez mais. E ali estava.
- Feito o último... como sabemos que é o caminho certo?
A voz da elfa menina não o incomodava tanto quanto a verdade por trás daquela pergunta. - Sem um oneiromante nem a bússola, não sabemos. Não temos opção. - O único som que os dois faziam eram os leves passos da princesa sobre as folhas secas pelo chão. Foi fácil ouvir o primeiro soar de uma corneta de prata, ecoando pelas rochas pontiagudas que os cercavam. A chama da tocha à mão do guerreiro silencioso bruxuleava como se prestes a se apagar. - A Caçada. Não temos mais tempo, milady Catarina. - O cinzento segurava a menina pelo pulso e a puxava atrás de si. Mesmo correndo, ele não emitia um som sequer.
- Como pode? Ele chamou os Caçadores sobre nós... mas ele é um de nós... como pode? - A menina começava a respirar ofegante, tentando se esforçar para acompanhar a marcha veloz de seu protetor. Aquele sopro grave lhe arrepiara até os ossos e só o puxão de Rogério a trouxera de volta do torpor do medo. Corria novamente, sentindo o Sonho que os rodeava reagir ao medo e à ansiedade, como se as pedras se fechassem ainda mais sobre ambos. Pensava que a oneiromante estava tão longe dali e deixava uma das frágeis mãos esticar-se até o sobretudo do Andarilho, agarrando-o para não se perder na corrida desabalada. Pedras e plantas pontiagudas rasgavam-lhe o já puído vestido claro, lanhando as pernas e os cotovelos.
O segundo soar da corneta estava perto demais. Rogério corria à frente, mas logo tomava a princesa pelo pulso e esta sentia as próprias pernas falharem em acompanhar a velocidade daquele cavaleiro. O lugar parecia tentar impedi-los, mas ele se recusava a parar.
- Bia... desculpa... - Ele murmurava para si mesmo, ao perceber uma clareira que surgia em meio àquele labirinto frio. Um poço antigo e em ruínas erigia-se do centro do local. O guerreiro não hesitava por um segundo sequer, antes de se jogar com Catarina, praticamente de um salto, puxando o braço da menina e impulsionando-a por sobre aquela mureta desgastada.
- Ãhn? O q? - A menina não via à frente, seus olhos assustados haviam percebido os cães de caça dos Fae aproximando-se rapidamente e por um momento se desnorteou. Seu protetor a arremessava naquela abertura e ela percebia o escuro espelho d'água aproximando-se rapidamente. Mal tinha tempo para erguer suas forças e abrir uma passagem de volta ao mundo que conhecia. Mas antes da travessia, ainda olhava para cima, na esperança de ver o Andarilho saltar atrás de si. Uma lágrima soltava-se de seu rosto, percebendo que estaria só, do outro lado.
O rasgar do vento ao seu redor era trocado pela sensação de ir atravessando uma série de panos e lençóis, a queda freando-se daquele jeito brusco e o corpo girando desajeitado. Os cabelos colando-lhe à face, todos os sentidos trazendo-lhe aquela mudança súbita de ares. A claridade trazendo o medo de abrir os olhos. Os dedos sentindo o frio concreto e todo o corpo assolado por uma fina chuva.
Ali, deitada, a princesa da primavera esperava não ter que admitir que estava enfim só. Respirava fundo, sentindo o frio tomar-lhe os ossos, aos poucos. Chorava, em silêncio...
9 comentários:
Uff! Sem fôlego...
Gosto de ler esses textos que começam, simplesmente.
Hunfs!
Onde está Rammstein? >.< você tirou!
MAMA:
Essa fuga percorre minha mente em lembranças, de tempos em tempos. Saudade de qdo tinha tempo pra jogar RPG. *rs*
GLUTONE:
Caríssima, Rammstein continua na lista de reprodução do Palácio, mas eu fico mudando a ordem, regularmente, pra dar algum destaque às mais de 60 música q já coloquei ali.
a intro dessa música lembra o astronauta de mármore.
e a sequência dela acompanha crescentemente o texto, numa corrida de Rogério, num acelerar do coração da princesa...
E as lágrimas...são nuvens que virão;
sopros de luz
bjs
Aff...
Perfeito. Lágrimas e solidão que quase mata...
Beijos.
saudade do rpg né? rsss
bj
Huuum. eis que surge a continuação de algo que teve um início há tanto tempo atrás. Uma continuação fluida, envolvente e que nos deixa o saboroso gosto de querer mais. Por favor, meu caro Andarilho, não abandone essa história mais uma vez.
WOLF:
A música é das minhas favoritas, com certeza. E adorei q tenha gostado do texto, caríssima.
MAI:
A solidão por vezes tbm pode acolher... mas é amarga de qqr maneira.
IARA:
Saudade de ter tempo pra essas coisas, na verdade. *rs*
TYR:
Não pretendi jamais abandoná-la em definitivo, caríssima, não se preocupe.
A fuga nem sempre é o melhor meio de sair de uma batalha. Mas nunca caçada, torna-se atitude inevitável para a caça..
Os olhos para a boca do poço, o desejo da companhia, o medo da solidão, também me trariam medo de abrir os olhos...
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