Queimava. Sim, aquele fruto da flecha de Eros deixava-se arder com uma intensidade tão grande que saíra de controle e agora era como se essa o consumisse. Tolo que é o amor, não percebeu que crescia desordenado e agora tentara englobar o mundo, e por isso seu próprio calor o fazia gritar, dentro daquele peito, sentindo-se desfazer como se o lamber das chamas o corroesse. Sentia que poderia perder-se em cinzas e isso o apavorou. O menor sopro, depois, e se perderia no vento.
Estúpido amor, perdido à ânsia de abraçar o mundo, quis ser tudo, quis tornar-se único àquele coração e agora ardia, cauterizando a certeza de que jamais seria tão grande assim. Da queda ao chão, o grito derradeiro, já sem asas para abrir e voar, sentia o cheiro da própria morte tomar-lhe as narinas... a mão estendida... os dedos se contorcendo. Queria de novo morder daquela maça, provar daquele beijo de sol, do beijo de chuva... ali, sentia-se desfazer nas cinzas.
Toda a angústia se abateu, quando não passava daquele montinho enegrecido, que em nada lembrava o sentimento que já fôra. Não havia mais dor, como não havia mais nervos ou mesmo coração, para senti-la. Não havia mais dor, como não havia mais peso. Quis chorar sem ter olhos ou lágrimas, e então sentiu o que se aproximava. Fosse o vento, fosse o sopro, estaria para sempre perdido, espalhado, e esse pensamento trouxe-lhe novo terror, como somente a massa do nada, da inexistência, poderia trazer. Ali, a um passo do mundo perdido do eterno ébano. Esquecimento. No fundo, sabia que o merecia. Que seu tolo egoísmo precisava ter um preço. Sempre tivera a certeza de não poder ser dono daquilo que cobiçara demais.
Não era o vento... duas mãos vinham juntar toda a fuligem, a poeira, a dor. Vinham proteger aquele ardido sentimento, contra o sopro, amontoando pedaços, fibras e grãos em um pequeno montinho, cuidadosamente.
- Eu tbm quero isso, seu bobo. Te bastar. É tão egoísta.
Àqueles sussurros, um sopro tão diferente o viera despertar. E ali, entre aquelas mãos, surgia a chama renovada. Daquelas cinzas, erguia-se algo que aquele peito até então desconhecera, na tolice de crer que tudo já compreendia. Respirava fundo, como se de volta ao primeiro inspirar de vida. Renovara-se até mesmo de antigas marcas. Ali levantando-se para enfim abrir os olhos e romper limites tantos.
The Phoenix, de ~Suirebit, no deviantART.